June 07, 2009

entre les murs



  É de facto espantoso o quão aparentado da realidade pode ser um filme. No meio de tanta ilusão e imaginação é, de facto raro algo tão sentido e real. Pássa-se em Paris mas esse facto é apenas relembrado pela língua dos discursos porque a trama, essa poder-se-ia passar em qualquer escola da minha realidade.

  Não é um filme ‘comercial’, não tem banda sonora nem os actores deslumbrantemente falsos do cinema americano e, ainda assim, surpreendeu-me tanto que ainda mal consigo acreditar nele.

  É incrível a capacidade de relactar a selvajaria que se encontra na massa da educação. Mas este filme não retracta apenas o tradicional ‘os professores são os bons e os alunos os maus’ como geralmente acontece quando descrito por alguém abstracto ao assunto. De facto, uma das situações que retive na memória foi a banalidade e frieza com que, depois da informação de que uma mãe de um aluno iria ser deportada para a China, uma professora anuncia com leviana insensatez que estava grávida: e sala enche-se de felicitações e copos de champagne.
Aqui transborda a hipocrisia que nojo me dá de quem governa que, em 12 ‘conselhos disciplinares’ expulsou 12 alunos. Esta reunião que teoricamente serviria para se pensar como se poderia ajudar um aluno a ser bem sucedido reveste-se de uma ridícula burocracia e fantuchada que chega ao cumulo de os professores escreverem em papel branco se o aluno deve ou não ser expulso (porque essa foi a única coisa que se votou naquela ‘cerimónia’) e de os votos serem colocados numa urna de acrílico transparente com fechadura e tudo. Enojou-me fazer parte deste sistema que compara em palavra de personagem usar um telemóvel na aula e expulsar um aluno de uma escola que corre o risco de ser deportado para Àfrica.

  Logo no início, a hipocrisia emanada pelo director é salientada pela proposta de um sistema de penalização dos alunos ‘semelhante à carta de condução’ em que se retira pontos aos mal-comportados. A utopia e abstracção da ideia só é superada quando, passados cinco minutos de discussão sobre o tema alguém diz ‘bem, vamos passar a um assunto mais importante que é a subida do preço do café da máquina de 40 cêntimos para 50 cêntimos.’

  É aqui também representada a realidade que é ser-se estudante no agora, onde os aprendizes da sociedade decadente têm que balansar uma vida social, interactiva e incessante com o retrógrado ‘programa de ensino’ da escola. Quando os alunos, em línguas têm que conjugar verbos e respondem, como TODOS os professores de línguas ouvem TODOS os anos: ‘mas já ninguém fala assim, porque temos de saber isso?’ Onde os alunos, apesar de terem regras sociais diferentes da norma ostracizam-se e, simultaneamente se defendem como um grupo que tenta lutar contra correntes retrógradas que os limitam. Estudantes que se unem contra algo não produtivo, não eficiente, não organizado. Até o próprio edifício denota a falta de pensamento social para o que É a educação.

  Uma escola moderna, com boa apresentação, perfeita para um postal e complectamente desadequada ao propósito. Um pátio minúsculo, com solo em cimento e um muro altíssimo, que quando olhei e vi, apenas me lembrou uma prisão. Salas de aulas minúsculas onde mal espaço há para 25 (ou, como numa escola secundária normal em Portugal, 35) alunos se moverem. Mas não, nas salas desta escola não havia um computador da Era da pedra que não funciona decentemente com um sistema de anti-virus/SPAM ineficaz em cada sala. Nem cada aluno tinha um computador portátil. Mas isso não impediu a minha parte preferida do filme: quando os alunos e o professor deixaram de falar do programa e passaram a falar da vida, do que é que cada um considera pessoal e de discussões filosóficas e constructivas. Onde cada um naquela sala se expressou e onde, por momentos, toda a gente estava interessada no mesmo.

  É, de facto espantosa a maneira como cada aluno e cada professor perde o rosto da personagem para poder ser aquele colega de Matemática na sala de professores ou a aluna que quer ser polícia ao nosso lado.
Porque os alunos apenas reagem àquilo que a sociedade os restringe. Os alunos são um producto da hipocrisia e burocracia de um sistema que foi apenas pensado no abstracto mas que alguém se esqueceu de dizer ‘agora vamos aplicar esta ideia bonita e cor-de-rosa à realidade’. E, se algum professor luta para defender um aluno - os alunos - é criticado pela massa que o rodeia e reprimido pelas estúpidas regras que o prejudicam.

  A Turma levanta a mão e diz: chega de gente que não sabe o que faz. Chega de meter políticas onde políticas não se devem meter. CHEGA DE SUJAR BOAS MENTES COM A VOSSA SUJA HIPOCRISIA.

CHEGA!

Maxwell Black

07 June 2009

10:15pm


3 comments:

  1. Já várias vezes ouvi falar deste filme e cada vez mais tenho vontade de o ver...depois do que li, acredito que este seja mesmo o próximo! =)

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  2. É um filme que vale a pena ver. A mim não só me deixou inspirado mas, de certa forma revoltado por ser real. Vale com toda a certeza a Palme d'or que ganhou :)

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  3. Tenho que admitir que ainda não vi o filme... tenho uma resistência "natural" a produtos francófonos...
    Mas lembro-me de ver as reportagens sobre a vitória no Festival e de ter pensado que são filmes com esta índole que devem vencer galardões.

    Deixei-te resposta no meu cantinho aos teus últimos comentários... mas achei por bem vir avisar.
    Beijinho,

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